Polyanna Arruda Borges: brutalidade, corrupção e injustiça

Quando Polyanna Borges, de 26 anos, desapareceu em Goiânia, em 23 de setembro de 2009, a cidade inteira ficou sabendo. Jovem, bem sucedida e filha da classe média alta,...

Quando Polyanna Borges, de 26 anos, desapareceu em Goiânia, em 23 de setembro de 2009, a cidade inteira ficou sabendo. Jovem, bem sucedida e filha da classe média alta, seu sumiço tornou-se sensação na mídia, consequentemente abalou a cidade. Recém casada e dona de uma agência de publicidade, Poly era uma das palestrantes da Semana de Comunicação da PUC-GO, mas ela nunca chegou ao auditório. Seu Prisma preto foi encontrado parcialmente queimado e, dois dias depois, o horror: seu corpo nu descoberto em um matagal, alvejado com oito tiros. Quem quer que a tenha matado estava com raiva.

Devido à repercussão, parecia que o caso seria solucionado rapidamente, mas tudo começou a ficar estranho quando delegados foram substituídos em série e o caso passou de delegacia para delegacia — DEIC, DERFRVA, DENARC, Homicídios… Mais de dois anos depois a polícia apresentou quatro homens. Outros três, que também participaram do crime, foram assassinados misteriosamente no decorrer da investigação.

Eles pertenciam a uma quadrilha de roubo e desmanche de veículos. Um deles, Leandro Garcêz, encomendou o roubo de um Prisma preto, que posteriormente seria adulterado e clonado. Quatro criminosos saíram com essa missão pelas ruas de Goiânia. Quando abordaram Poly, eles podiam ter levado apenas o carro, mas ela era bonita e os bandidos mudaram o plano. Poly não reagiu ao assalto, mas reagiu à violência sexual. “Mãe, me ajuda!”, gritou enquanto era violentada pelos quatro bandidos no matagal. Quando um deles levou um tapa na cara, se enfureceu e descarregou o revólver, matando-a “porque ela não me quis”, como confessou mais tarde.

A demora na investigação, as queimas de arquivo e a prisão de “peixes pequenos” deixaram um gosto amargo. Não que agentes públicos pudessem estar diretamente envolvidos, mas indiretamente estavam. Um dos mortos era informante da polícia e tinha livre acesso a delegacias. Já outro era comerciante na “Robauto” — região usada para receptação, troca e venda de peças roubadas e que estranhamente nunca foi fechada pelas autoridades.

Oito anos após o julgamento, três dos condenados já estavam nas ruas, beneficiados pelas leis brasileiras.

Já a Robauto continua intocável.

É provável que se a vítima não fosse Polyanna — uma mulher jovem, branca, bonita, bem sucedida e de “família” — o crime nunca teria sido resolvido (na realidade, foi em parte). Dois fatores foram essenciais para que o homicídio fosse, aos trancos e barrancos, investigado: [1] o caso teve ampla cobertura na mídia, inclusive nacional, chegando a ser comentado na época por Glória Perez; [2] a família, de classe média alta, fez enorme pressão nas autoridades e não descansou enquanto os autores não foram identificados. Pessoas próximas ao caso não têm dúvidas de que o crime só foi solucionado pela pressão de fatores externos. Em recente entrevista para a Record Goiás, Manoel Vanderic, amigo da vítima e atualmente delegado da PCGO, comentou: “Hoje, ciente de como funciona o mundo jurídico e policial, até porque eu faço parte, sem dúvida, sem a movimentação da família, eu acredito que esses autores nunca teriam sido presos”.

Redes criminosas de roubo de veículos possuem tentáculos dentro da sociedade que podem se estender a órgãos de estado, como o Detran. Em Goiânia existe uma região pejorativamente chamada de “Robauto”, onde sobrevive um riquíssimo comércio de peças de automóveis. É um lugar onde é possível montar um carro novo só com peças usadas. Uma parte dos comerciantes é honesta, outra boa parte é composta de bandidos e receptadores que se misturam aos lojistas. Historicamente, é um lugar onde carros roubados podem ser desmanchados para venda de peças ou clonagem, daí o nome: ROuBo + AUTOmóvel. A Robauto existe HÁ DÉCADAS e o poder público e seus agentes nunca tiveram interesse em desarticulá-la. Leandro Garcêz era um “comerciante” na Robauto e a sua encomenda de um carro roubado desencadeou um crime brutal que traumatizou os goianos.

OS 7 ENVOLVIDOS


1. Leandro Garcêz: encomendou o roubo do Prisma preto a Diango. Condenado a 21 anos de prisão. Ficou preso por 8 anos e foi solto em 2020.

2. Diango Gomes: contratou os ladrões para roubar um Prisma preto. Condenado a 23 anos. Ficou preso por 7 anos e foi solto em 2019.

3. Marcelo Barros: participou do sequestro, estupro e assassinato de Polyanna. Condenado a 25 anos. Ficou preso por 8 anos e foi solto em 2020.

4. Assad Haidar: estuprou Polyanna; responsável por efetuar os oito disparos que a mataram. Condenado a 45 anos. Ele é o único que continua preso.

5. Luciano Assis: guardava o Clio usado pelos ladrões. Assassinado dois meses após o homicídio de Polyanna.

6. Lanovierri Neiva: participou do sequestro, estupro e assassinato de Polyanna. Assassinado por PMs em uma suposta troca de tiros três meses após o homicídio de Polyanna. Acredita-se que Deberson tenha repassado aos PMs informações sobre a localização de Lavonierri.

7. Deberson Ferreira: participou do sequestro, estupro e assassinato de Polyanna. Era informante das polícias civil e militar, com livre trânsito em delegacias e na Secretaria de Segurança Pública; portava arma e até distintivo de polícia. Assassinado cinco meses após o homicídio de Polyanna. Foi morto logo após o primeiro delegado do caso chegar ao seu nome, indicando que pessoas de dentro da força-tarefa agiram para sabotar a investigação.

Assista aqui à uma reportagem do programa Fantástico, da Rede Globo, sobre a “Robauto”.

Referências: [1] Polícia Civil conclui investigação do assassinato de Polyanna Arruda com prisão dos acusados. PCGO; [2] Polícia conclui inquérito do caso Polyanna Arruda. A Redação; [3] Dois anos de impunidade. A Redação; [4] Caso Polyanna Borges: 11 anos depois, só um dos quatro condenados está preso. Jornal Opção; [5] Mãe pede condenação de presos. O Popular; [6] “Nada pode ficar obscuro”, diz Tânia Borges, sobre assassinato da filha Polyanna Arruda. Jornal Opção; [7] Juiz condena quatro pela morte da publicitária Polyanna Borges, em GO. G1; [8] CASO POLYANNA BORGES: PUBLICITÁRIA FOI MORTA HÁ 13 ANOS DURANTE ROUBO. Record Goiás.

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Daniel Cruz
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