No post anterior (leia aqui), eu escrevi sobre um dos filmes mais inteligentes que eu já vi, o holandês Spoorloos, um filme que não foi lançado comercialmente até 1991, talvez porque os distribuidores temiam que o público norte-americano não aceitasse o pessimista, mas inevitável final. Mas isso não importa, porque em 1993 os próprios americanos fizeram a sua própria versão do filme, mas com um final diferente, e isso acabou sendo um insulto à inteligência deles mesmos.
O filme original conta uma história simples. Um casal está de férias e param em um posto na estrada. A mulher entra em uma loja de conveniência para comprar bebidas e desaparece sem deixar rastros. Por três anos o marido busca incansavelmente por uma resposta que tire dele sua dor. O final do filme original é apenas o retrato do filme. Nenhum outro final poderia ser encaixado ali, e é por isso que o final do filme hollywoodiano estraga essa versão.
E o mais estranho nisso tudo é que George Sluizer, diretor do original, foi também o diretor contratado para realizar a versão de Hollywood. Ele atacou selvagemente sua obra-prima em prol das “regras” dos finais felizes. Mesmo assim, The Vanishing (O Silêncio do Lago) é um filme que poderia ter sido perfeito, a começar pelo elenco, que conta com os ganhadores do Oscar Jeff Bridges e Sandra Bullock, além de Kiefer Sutherland (o famoso Jack Bauer da série 24 horas).
Diferentemente de Spoorloos, O Silêncio do Lago começa sob o ponto de vista do psicopata Barney Cousins, um professor universitário e pai de família que, aparentemente, sempre teve fantasias sobre raptar uma mulher. Desde o começo ele planeja essa ação, mas nunca fica claro o porquê. Em seguida somos apresentados ao casal vividos por Kiefer Sutherland e Sandra Bullock, que estão de férias e viajam pelo país. A mulher desaparece no posto de gasolina e o marido começa sua obsessiva busca pela mulher desaparecida. O filme quase todo é focado na obsessão do marido em encontrar uma resposta. Ele deixa sua vida de lado para tentar entender o que aconteceu com sua esposa. Transpondo isso para a vida real, desaparecimentos sçao uma tragédia que vemos quase que diariamente. Talvez o exemplo mais famoso seja as Mães de Maio na Argentina cujos filhos desapareceram a mais de 40 anos durante a ditadura militar e até hoje elas se reúnem em busca de respostas.
Outro personagem importante em ambos os filmes é a nova namorada do marido. Em Spoorlos, ela o deixa depois de entender que não conseguirá competir com a memória da desaparecida. Mas no filme holywoodiano, a namorada, vivida por Nancy Travis, não sai de perto dele (talvez porque ela será necessária no final). Sua compaixão muda sua vida.
Em seu impiedoso desdobramento, Spoorlos é um filme existencial, já O Silêncio do Lago meio que se transforma em um filme slasher com um final clichê. É uma pena pois o cinema norte-americano mostrou mais uma vez que prefere a superficialidade do que a profundidade. George Sluizer dirigiu dois filmes com a mesma história, um é uma obra-prima, já o outro é o típico produto lobotomizado de hollywood. O grande problema de O Silêncio do Lago é a sombra, a sombra de Spoorloos.
Informações
Título no Brasil: O Silêncio do Lago
Direção: George Sluizer
Escrito Por: Todd Graff, Tim Krabbé
Elenco: Jeff Bridges, Kiefer Sutherland, Nancy Travis, Sandra Bullock
Edição: Bruce Green
Distribuição: 20th Century Fox
Lançamento: 05 de Fevereiro de 1993
País: Estados Unidos
Obs.: Inspirado no Livro Het Gouden Ei
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