Ao deixar um filho na escola, nenhum pai imagina que ele possa estar em perigo. O século 21, entretanto, trouxe um novo tipo de ameaça: o adolescente-estudante que se volta contra seus pares.
Os franceses ainda enxugam as lágrimas com um triste caso ocorrido na última semana. “Terror e choque após uma cena de violência sem precedentes”, escreveu o Le Monde. Dessa vez, a vítima foi Lorène, esfaqueada 57 vezes na sala de aula, na frente de toda a classe, por outro aluno — Justin Polat, 16.
Pouca coisa foi divulgada sobre o adolescente, exceto que ele tem um “perfil complexo”, sendo descrito como “extremamente solitário”, adorador de Hitler e do nazismo. Na coletiva de imprensa, o promotor revelou que o motivo é “muito complicado de encontrar”. Tal fala já se tornou clichê. Em 2017, por exemplo, escrevi sobre o menino de Goiânia que, aos 13 anos, esfaqueou brutalmente a vizinha, que estudava na mesma escola. O crime, também, foi “sem motivo”. Existe uma lista sem fim de casos de meninos que matam meninas “sem motivo”.
Há onze anos esmiucei o perfil do homicida incel Elliot Rodger e me parece que todos esses garotos saem do mesmo caldeirão. São jovens que mascaram seus sentimentos, vivem em cantos obscuros da Internet, socializando virtualmente e consumindo a podridão de fóruns racistas e misóginos. Seus ídolos são pessoas nefastas: genocidas, assassinos em massa, atiradores de escola (notadamente os autores de Columbine). Vivendo atrás das telas, eles recortam um retrato irreal do que é o mundo. Rodger, o brasileiro Guilherme Costa (que também matou uma garota esfaqueada) e Polat, por exemplo, expressaram em textos suas visões distorcidas, compartilhando seus “manifestos” na Internet. Eles dividem a angústia por serem anônimos em um mundo onde todos parecem celebridades.
Essa angústia, porém, não é exclusividade da era digital. Em Anjos Cruéis, apresento o caso de um homicida serial de 14 anos que, em 1997, expressou sua agonia às autoridades por sua invisibilidade social.
Cada caso é diferente, mas não existe essa de motivo “difícil” ou “inexistente”, está tudo escancarado — até na TV.
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