“A não ser pela ausência de motivação política, os assassinos em massa são bem similares aos homens-bomba: homens e mulheres determinados a causar um grande impacto ao morrer e levar o maior número possível de pessoas com eles. Apesar de tudo, o suicídio é relativamente raro entre os serial killers. O prazer que obtêm com suas atrocidades é tão intenso que continuam a cometê-las até que sejam forçados a parar.”
[Harold Schechter – Serial Killers, Anatomia do Mal]
Educado nas mais prestigiadas universidades da Inglaterra, Montague John Druitt formou com honras em 1880 no curso de História Clássica Antiga. Enquanto estudava em Winchester, Druitt se envolveu fortemente no debate social, se tornando um orador que discursava principalmente sobre política. Ele não gostava do Partido Liberal, nem da influência do chanceler alemão Otto von Bismarck, “moralmente e socialmente uma maldição para o mundo”, segundo ele.
Membro de clubes de esporte e um esportista nato, Druitt tinha talento jogando críquete, ficando em terceiro lugar em um campeonato em 9 de março de 1875, lançando uma bola a mais de 92 metros.
Após sua formatura, começou a lecionar em um internato de Blackheath, Londres. Em 1881, Druitt se inseriu na associação local de críquete, passando a jogar pelo clube.
No ano seguinte, Druitt decidiu estudar Direito, sendo admitido no Inner Temple em 17 de maio de 1882. Três anos depois seu pai faleceu, deixando uma herança de pouco mais de 16 mil libras para ele e seus irmãos. Em julho de 1888, a tragédia o atingiu novamente quando sua mãe sucumbiu à doença mental, sendo internada à força no Asilo Brook, em Clapton – naquela época ser internada em um manicômio sugeria morte certa (o que veio logo para ela) além de vergonha à família. Mas apesar dos tumultos, Druitt construía sua vida de forma bastante admirável. Ele pareceu lidar bem com a perda dos pais, mas então algo aconteceu.
No dia 31 de Dezembro de 1888, Henry Winslade, um barqueiro que percorria o rio Tâmisa, descobriu um corpo em decomposição por volta da 1h da madrugada. Era Montague John Druitt, que desaparecera quase um mês antes, no começo de dezembro. Havia quatro pesadas pedras em cada bolso de sua calça; sem sinal de trauma no corpo. A autópsia indicou suicídio.
De acordo com o testemunho de seu irmão William (que identificou o corpo), Druitt foi demitido de sua posição de professor na Blackheath School por um motivo desconhecido (alguns autores sugerem que ele foi demitido devido às suas tendências homossexuais e que ele teria molestado seus alunos. Mas isso é pura especulação). Nem mesmo a data de sua demissão é conhecida.
Mas por que um jovem de futuro como Druitt cometeria suicídio?
Seu nome e sua história nunca teriam chegado até nós não fosse uma sinistra descoberta décadas depois. No final dos anos 50, Lady Aberconway descobriu um memorando de seu pai, Sir Melville Macnaghten, ex-chefe da Scotland Yard e investigador de um dos mais famosos casos criminais da história: os assassinatos em série de Jack, o Estripador. Para Macnaghten, Druitt era o sanguinário assassino em série que atacou em Londres de agosto a novembro de 1888 – deixando prostitutas estripadas nos becos da imunda Whitechapel. Quando Druitt suicidou, os crimes cessaram. Jack nunca foi preso ou oficialmente identificado, mas Druitt era o principal suspeito de Macnaghten.
O suicídio de Druitt teria relação com os assassinatos? Ou ele apenas tinha medo de ficar louco como sua mãe? Os motivos permanecem desconhecidos.
O suicídio entre serial killers
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Serial Killers raramente tiram a própria vida, mesmo quando estão sob custódia policial ou prisional, e isso é intrigante quando ocorre. Na verdade, é raro o suicídio entre os seres humanos na medida em que consideramos a população mundial. De acordo com um relatório da Organização Mundial da Saúde publicado em 2015, cerca de 1 milhão de pessoas morrem dessa fora anualmente, isso representa 0,0001% da população mundial. Mas quando falamos de serial killers, uma série de características que se relacionam a eles parecem desafiar diretamente a noção do suicídio.
A maioria dos serial killers se encaixam na descrição de um psicopata; eles não tem consciência, possuem uma capacidade muito limitada para a emoção e empatia, e muitos são profundamente narcisistas. Desprovido de consciência, o serial killer não será assombrado pelos seus atos, o que significa que eles não sentem muita dor ou angústia, ao contrário de assassinos envolvidos em crimes passionais ou militares que por ventura tirem vidas em uma missão. Portanto, uma consciência pesada não parece ser um fator que levaria um serial killer a cometer suicídio. A falta de empatia, também, é algo que nos leva a acreditar que eles não remoem o sofrimento de suas vítimas ou famílias.
O elemento narcisista do comportamento psicopata, no entanto, é intrigante. De um lado, é difícil imaginar alguém que pensa tão bem de si mesmo querendo acabar com a própria vida, mas, por outro lado, se as restrições ambientais e sociais afetarem seus desejos egoístas, então ele pode chegar à conclusão de que a vida não vale mais a pena ser vivida. Em “Eleven Deaths of Mr. K. – Contributing Factors to Suicide in Narcissistic Personalities” (2008), Ronningstam, Weinberg, e Maltsberger oferecem inúmeros motivos do porquê personalidades narcisistas podem ser propensas ao suicídio. Uma é bastante relevante aqui: a perda do auto-estado ideal.
“[um conglomerado] de experiências que são desejadas e associadas à uma sensação de prazer ou auto-estima positiva”.
Um desvio desse estado causaria dor e desconforto.
Vale salientar que existem diferenças acentuadas entre transtorno de personalidade narcisista e transtorno de personalidade antissocial. Uma delas é que pessoas com narcisismo necessitam da admiração dos outros, para alimentar o seu ego e sua auto-estima, já os psicopatas não precisam desse reconhecimento (pois tem a certeza da sua superioridade).
Psicopatas podem ser incapazes de sentir uma gama de emoções, mas acredito ser verdade que eles experimentam prazer e frustração. É provável que eles façam escolhas que visam maximizar o prazer e minimizar a frustração, mas ao contrário da maioria das pessoas, psicopatas geralmente têm um fraco controle do impulso, e muitas vezes são viciados em sexo, drogas e álcool. Em outras palavras, psicopatas anseiam por estímulos, e um dos motivos que tem sido oferecido para isso é que eles tem uma baixa frequência cardíaca quando estão quietos, em repouso. Essa baixa frequência cardíaca em repouso cria uma sensação desagradável e, portanto, o indivíduo busca estimular-se para atingir um nível melhor ou até mesmo “normal” de excitação, é o que diz Raine & Portnoy em “Biology of Crime: Past, Present, and Future Perpsectives” (2012).
Então, se um serial killer psicopata, de repente, se encontra em um ambiente que não lhe permite buscar o tipo de prazer que deseja, não seria irracional assumir que alguns deles decidam acabar com a própria vida. Essa ideia é reforçada pelo fato de que os poucos que o fizeram (normalmente se enforcando), o fizeram enquanto estavam sob custódia da polícia ou na prisão (necessidade de ter o controle absoluto da sua vida). Um caso interessante é do canibal de Milwaukee Jeffrey Dahmer. Apesar dele não ter cometido suicídio, Dahmer parecia ter vontade de colocar um fim à sua angustiante existência. Ao contrário de outros psicopatas assassinos como John Wayne Gacy e Ted Bundy, Dahmer não fez qualquer esforço para evitar a morte. Se recusou a receber tratamento especial na cadeia, mesmo sabendo que, dada sua fama, seria um alvo tentador para outros presos. E não deu outra. Ele foi assassinado na prisão, com indícios de que não reagiu ao ataque. Era como se estivesse encomendado a própria morte.
Obviamente que (como tudo na Criminologia) não podemos restringir a causa do suicídio entre serial killers a uma mera restrição do que lhe dá prazer. Alguns estranhos exemplos existem na literatura, como o caso de um psicopata americano que se entregou à polícia por vontade própria apenas para se matar depois. Em 5 de Março de 1970, Mack Ray Edwards apareceu por livre e espontânea vontade no Departamento de Polícia de Los Angeles, Califórnia. Ele admitiu aos policiais estar envolvido no desaparecimento de duas crianças e deu informações sobre onde os corpos estariam. Ele também confessou que há 17 anos matava menininhas. Antes de seu julgamento, ele tentou o suicídio duas vezes. Ao júri, relatou o desejo de ser executado. Ele conseguiu a sentença que desejava, mas como tudo na justiça demora demais, ele decidiu antecipar seu destino se enforcando com um fio elétrico.
Abaixo segue alguns outros exemplos de serial killers que decidiram por tirar a própria vida:
Serial Killer: Joseph “Joe” Ball
Suicídio: 24 de Setembro de 1938
Forma: arma de fogo
Como foi: Quando dois policiais apareceram em sua taberna para levá-lo até a delegacia e prestar depoimento, Joe Ball – que havia matado algumas de suas vítimas atirando-as aos seus crocodilos de estimação – foi para trás do balcão, marcou “Sem vendas” na caixa registradora, tirou uma arma da gaveta e deu um tiro na própria cabeça.
Serial Killer: Jack, o Stripper
Suicídio: Fevereiro de 1965
Forma: envenenamento por monóxido de carbono
Como foi: Um maníaco nunca capturado matou pelo menos seis prostitutas a partir de fevereiro de 1964 na localidade de Hammersmith, Londres. Seus crimes lhe renderam o apelido de “Jack, o Stripper”. Um dos principais suspeitos – um segurança que trabalhava perto do local em que ocorrera o último assassinato – suicidou-se no ano seguinte, deixando um bilhete em que dizia “não aguentar mais a pressão”. Sua morte coincidiu com a repentina interrupção dos crimes.
Serial Killer: Charles Ray Hatcher
Suicídio: 7 de Dezembro de 1984
Forma: enforcamento
Como foi: Psicopata, esquizofrênico, pedófilo e pervertido sexual, Charles Hatcher estuprou e matou pelo menos 16 crianças e adolescentes durante os anos 70 e início dos 80. Em seu julgamento, implorou para o júri lhe condenar à morte, mas recebeu prisão perpétua. Quatro dias depois da sentença se enforcou em sua cela da prisão.
Serial Killer: Leonard Thomas Lake
Suicídio: 6 de Junho de 1985
Forma: envenenamento
Como foi: Detido sob a acusação de furto, Leonard Lake – que, junto com seu parceiro igualmente psicopata Charles Ng, cometeu diversos horrores em seu bunker de tortura no norte da Califórnia – engoliu rapidamente uma pílula oculta de cianureto na frente do policial que o interrogava na delegacia.
Serial Killer: Gert van Rooyen
Suicídio: 15 de Janeiro de 1990
Forma: arma de fogo
Como foi: Pedófilo e serial killer, o tiozão sul-africano Gert van Rooyen e sua esposa, Joey Haarhoff, era acima de qualquer suspeita. Acredita-se que ele tenha assassinado pelo menos seis crianças entre 1988 e 1989. Elas eram sequestradas e levadas até sua casa, onde as mantinha no porão para estupros e, quando enjoava, as matava. Após uma vítima conseguir escapar e chamar a polícia, van Rooyen matou a esposa e cometeu suicídio.
Serial Killer: Dámaso Rodríguez Martín
Suicídio: 19 de Fevereiro de 1991
Forma: arma de fogo
Como foi: “O Feiticeiro” espanhol Dámaso Rodríguez Martín matou pelo menos três pessoas na área montanhosa de Anaga. Voyeur, Martín gostava de ficar olhando casais que subiam às escondidas até a montanha para manter relações sexuais dentro de carros. Após uma verdadeira caçada, a polícia o cercou em uma casa e O Feiticeiro decidiu por encostar uma escopeta no queixo e apertar o gatilho.
Serial Killer: Johann “Jack” Unterweger
Suicídio: 29 de Junho de 1994
Forma: enforcamento
Como foi: Psicopata sádico e narcisista, o austríaco Jack Unterweger ludibriou a todos em seu país como um exemplo de assassino reabilitado. Após matar uma mulher e sair em liberdade 15 anos depois, virou escritor, colunista e queridinho da mídia até ser desmascarado como o serial killer que estava matando prostitutas em Viena. Cometeu suicídio na prisão logo após ser condenado a perpétua.
Serial Killer: Frederick Walter Stephen West
Suicídio: 1 de Janeiro de 1995
Forma: enforcamento
Como foi: O maníaco devasso britânico Fred West – que, junto com sua segunda esposa igualmente depravada Rosemary, abusou, torturou, mutilou, esquartejou e enterrou no quintal de sua casa pelo menos 13 adolescentes, tudo por gratificação sexual – enforcou-se na cela dez meses antes de ser julgado. Ele tinha 53 anos.
Serial Killer: Herbert Richard “Herb” Baumeister
Suicídio: 3 de Julho de 1996
Forma: arma de fogo
Como foi: Quando a polícia de Indiana começou a desenterrar restos humanos da propriedade de Baumeister – pai de família, visto como equilibrado, que levava uma vida secreta como assassino sexual de homossexuais -, ele fugiu para o Canadá e deu um fim à própria vida com um tiro de grosso calibre na cabeça. Acredita-se que ele tenha matado até 20 homens.
Serial Killer: Andrew Phillip Cunanan
Suicídio: 24 de Julho de 1997
Forma: arma de fogo
Como foi: Parece que a fantasia de Andrew Cunanan era matar uma celebridade. Tom Cruise, Sylvester Stallone, Madonna e Gianni Versace estavam em sua lista. Dois meses depois de assassinar quatro pessoas, Cunanan matou a sangue frio Gianni Versace. Tendo matado o estilista italiano e realizado sua fantasia suprema, Cunanan pode ter decidido que a vida não tinha mais significado, então atirou em sua própria cabeça. Ser um dos dez homens mais procurados pelo FBI também pode ter contribuído para o seu ato final.
Serial Killer: Antonis Daglis
Suicídio: 2 de Agosto de 1997
Forma: enforcamento
Como foi: O grego Antonis Daglis odiava prostitutas, mas gostava de marcar encontros sexuais com elas. Quando o encontro não dava certo, Daglis as matava, picava e descartava os pedaços por florestas nos arredores de Atenas. Condenado à prisão perpétua em janeiro de 1997, cometeu suicídio seis meses depois, aos 24 anos.
Serial Killer: Javed Iqbal
Suicídio: 8 de Outubro de 2001
Forma: envenenamento
Como foi: Em dezembro de 1999, o paquistanês Javed Iqbal confessou em carta enviada a um jornal local o assassinato e esquartejamento de 100 crianças e adolescentes. Os corpos eram dissolvidos em ácido hidroclorídrico e descartados em um rio. Após ser condenado a morrer da mesma forma que suas vítimas, Iqbal cometeu suicídio na prisão.
Serial Killer: Harold Frederick Shipman
Suicídio: 13 de Janeiro de 2004
Forma: enforcamento
Como foi: Um dos mais significativos psicopatas da história da humanidade, o médico inglês Harold Shipman matou pelo menos 215 pessoas, e talvez até 260 – a maioria com injeções de heroína -, segundo investigação oficial. Casado e pai de quatro filhos, o Doutor Morte se enforcou na prisão um dia antes de completar 58 anos.
Serial Killer: John Wayne Glover
Suicídio: 9 de Setembro de 2005
Forma: enforcamento
Como foi: O serial killer australiano John Wayne Glover começou a matar após os 56 anos. Os assassinatos de seis mulheres idosas foram oficialmente ligados a ele, embora a polícia acreditasse que o número de vítimas fosse maior. Para alguns especialistas, as mortes podem ter sido uma vingança contra sua mãe autoritária. O psicopata cometeu suicídio na cadeia em 2005.
Serial Killer: Adimar Jesus da Silva
Suicídio: 18 de Abril de 2010
Forma: enforcamento
Como foi: Com traços de psicopatia e sadismo, Adimar Jesus da Silva assassinou seis adolescentes em Luziânia, Goiás. Desequilibrado, foi chamado de “delinquente sexual” por um psicólogo, assustando até mesmo colegas de cela. O serial killer se enforcou oito dias depois de ser preso.
Serial Killer: Israel Keyes
Suicídio: 2 de Dezembro de 2012
Forma: auto-mutilação e enforcamento
Como foi: Narcisista e dissimulado, o psicopata Israel Keyes foi ligado a 11 assassinatos de pessoas nos Estados Unidos antes de tirar a própria vida em sua cela de prisão no Alasca. Se vangloriou para o FBI por ter uma vida dupla – pai de família e empresário em uma e assassino na outra – e ninguém nunca ter desconfiado.
Não há como determinar o quão poderoso é o impulso de uma pessoa em tirar a própria vida, pois isso pode claramente variar de acordo com o momento e é dependente das razões e pensamentos do suicida. Essas razões e pensamentos, entretanto, são diferentes no assassino em série suicida, pois, afinal, eles tem uma patologia diferente. A depressão é muitas vezes listada como uma das principais razões do suicídio na população geral, mas é improvável que serial killers psicopatas experimentem depressão da mesma maneira que pessoas normais, já que eles são emocionalmente “atrofiados”. O sentimento mais próximo da depressão para eles é provavelmente o que nós conhecemos como frustração.
No fim das contas, é improvável que o suicídio dos assassinos em série causem compaixão, mas mesmo assim deve ser levado a sério. Por eles ser muito violentos e destrutivos, é de vital importância qualquer coisa que nos permita compreender melhor esse tipo de pessoa, especialmente se eles tiverem informações cruciais sobre suas vítimas, que o diga Israel Keyes, que levou para o túmulo o segredo de praticamente todos os seus assassinatos.
Universo DarkSide – os melhores livros sobre serial killers e psicopatas
Fontes consultadas: [1] casebook.org; [2] http://apps.who.int/gho/data/node.sdg.3-4-viz-2?lang=en [3] Serial Killers – Anatomia do Mal; [4] Biology of Crime: Past, Present, and Future Perpsectives; [5] Eleven Deaths of Mr. K. – Contributing Factors to Suicide in Narcissistic Personalities
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