
“Casa dos horrores assusta a nação: uma cidade do Wisconsin descobre que um vizinho é um sinistro assassino.”
[Life – 2/12/1957]
Reportagem Retrô é uma coluna do blog O Aprendiz Verde que traz reportagens, matérias e artigos antigos publicados em algum lugar do nosso tempo-espaço. Trazer essas matérias é uma forma de resgatarmos o passado e, por um instante, ter um vislumbre daquele registro de época.
A reportagem retrô de hoje foi publicada na revista Life, em 02 de Dezembro de 1957, e fala sobre a descoberta dos bizarros crimes de Ed Gein, o “Açougueiro de Plainfield”.
Assassinato e Mistério
Por Roy Rowan | Publicado na Revista Life em 02 de Dezembro de 1957

No amanhecer cinza do Wisconsin, um oficial da lei mantêm vigia para manter longe os curiosos da velha fazenda onde, até o dia anterior, um pacato homem chamado Ed Gein vivia. Foto: Life – 2/12/1957.
Na maior parte do tempo, Plainfield, Wisconsin, é uma cidade tranquila, com um centro comercial para as fazendas que a circundam. Na temporada de veados, caçadores aparecem nas matas próximas para persegui-los. Na primavera, amantes de pássaros assistem à dança de acasalamento do Tetraz-das-pradarias, uma espécie em extinção, e uma das quais se encontra por perto. Até recentemente, a maior excitação havia sido o desaparecimento de Mary Hogan, que tocava uma taberna local. Isso foi em 1954 e desde então nada demais acontecera por aquelas bandas.
Mas em um chocante dia semana passada, a pacífica Plainfield descobriu que estava hospedando um criminoso monstruoso, e que sua decrépita casa era o cenário de assassinato e depravação. Ed Gein, um solteiro de 51 anos, sempre foi aceito pela maioria como apenas outro cidadão de Plainfield. Alguns o achavam preguiçoso, até mesmo bobo. Ele andava por lá fazendo trabalhos estranhos, incluindo o de babá.
Então, a senhora Bernice Worden, que tocava uma loja ferragista na cidade, desapareceu. Seu filho encontrou manchas de sangue dentro. A última entrada do livro de vendas foi um anti-congelante e ele lembrou que Ed Gein havia dito que iria na loja comprar alguns. O delegado saiu para examinar a casa na fazenda de Gein.
Pendurado pelo pé na cozinha de Gein, o delegado encontrou o corpo sem cabeça e esviscerado da senhora Worden. Isso não era tudo. Havia 10 outras cabeças humanas – uma delas de Mary Hogan – algumas cuidadosamente envoltas em celofane, e uma cadeira estofada com pele humana.
Agora, Plainfield sabe que por anos conviveu com horror que parece pior por ter sido insuspeito. As revelações fizeram a primeira página em todo os Estados Unidos e deram uma consciência macabra aos americanos que o que aconteceu em uma obscura cidade do Wisconsin poderia ter acontecido em qualquer lugar.
Ed Gein foi revelado como um incrível assassino. Um psiquiatra de Chicago o chamou de “um dos mais dramáticos seres humanos a confrontar a sociedade.” No entanto, a medida total de seu mal pode permanecer para sempre um mistério. Ele admitiu apenas dois assassinatos e disse que roubou as outras cabeças de túmulos. Mas há fortes e assustadoras dúvidas sobre isso. À medida que a história começou a ser entendida, seus vizinhos perceberam que Ed Gein lhes estava dando pistas há muito tempo.

OLHANDO PARA O MUNDO DE GEIN, um homem e uma mulher atravessam seus olhares pela cortina suja e esfarrapada e vêem a cozinha toda em desordem. Todos de Plainfield foram ver a casa que eles antes ignoravam. Foto: Life – 2/12/1957.

Imagem da reportagem “House of Horrors” da revista americana Life de 2 de Dezembro de 1957.
QUARTO DA MÃE, LIMPEZA ENTRE SUJEIRA, FORNECE EVIDÊNCIA
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Nada melhor revelou a discreta discrepância entre as vidas pública e privada de Ed Gein do que um incidente no dia em que a Senhora Worden foi morta. Bob Hill (abaixo), um vizinho, parou e perguntou Gein se ele podia levá-lo à cidade. Bob ficou a poucos metros de onde o corpo estava pendurado, mas a escuridão cegou sua visão. Mais tarde, Bob disse: “Ele podia ter atirado em mim.” Em vez disso, Gein, o homem solícito que seus vizinhos presumiram que era, levou Bob para a cidade.
A questão para Plainfield e a nação é: Como Ed Gein chegou a ser o homem que era, vivendo em meio à imundície, com portas trancadas e sombras desenhadas, lendo revistas de detetives e livros de anatomia iluminado por lâmpadas de querosene? Todas as evidências apontam para a mãe de Gein – e apenas seu quarto permaneceu perfeito na casa desordenada.
A Senhora Gein era uma mulher de personalidade forte que acreditava que todas as mulheres eram pecadoras. Ed era seu favorito e ela incutiu suas crenças nele. Seu marido morreu em 1940, seu outro filho em 1944. Ela faleceu em 1945, após uma longa doença durante a qual Gein cuidadosamente cuidou dela. Então, Gein ficou sozinho.
Sob custódia, Gein deu várias declarações admitindo primeiramente uma, depois duas mortes, mas insistiu que roubou os outros crânios de cemitérios. Ele sempre desejou, confessou, ser uma mulher. Psiquiatras, estudando suas ações, acreditam que ele sofre de esquizofrenia ou tem dupla personalidade, dividida entre amor e ódio pelas mulheres – e talvez também sofra de uma forma selvagem de necrofilia, ou amor pelos mortos. Seu caso, diz o Dr. Edward K. Kelleher de Chicago, “não tem paralelos na história moderna.” E uma vez que a parte criminal esteja encerrada, Gein deveria, diz o Dr. Kelleher, ser estudado cientificamente para ajudar a detectar outros Geins ainda não descobertos.

VÍTIMAS CONHECIDAS DE GEIN, as duas que ele admitiu matar são a Senhora Bernice Worden e a dona de taberna Mary Hogan. Ambas foram assassinadas a tiros. Imagem: Life – 2/12/1957.

Bob Hill olha para o horror na casa que visitou no dia em que a Senhora Worden morreu. Foto: Life – 2/12/1957.

O quarto da mãe de Gein permaneceu limpo e arrumado. Foto: Life – 2/12/1957.

A cozinha de Gein é uma desordem suja de caixas, papel, partes de um corpo foram encontradas no fogão. Foto: Life – 2/12/1957.

Imagem publicada na revista Life mostra um pedaço do quarto da mãe de Gein (à esquerda) e a bagunça em sua cozinha (à direita), preenchida com caixas cheias de revistas sobre mulheres. Imagem: Life – 2/12/1957.

A vista da rua principal, preenchida com neve, mostra a loja ferragista de Worden onde Gein a matou e onde as pistas para sua prisão foram encontradas. Foto: Life – 2/12/1957.
VIZINHOS LEMBRAM DE CONVERSAS DE GEIN SOBRE MULHERES, ASSASSINATO –
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Na semana passada o correspondente da LIFE Roy Rowan entrevistou dois vizinhos de longa data de Ed Gein.
Desde que a porta da casa dos horrores de Ed Gein foi aberta, pessoas atordoadas de Plainfield lembraram-se de pequenas coisas sobre ele. Elmo Ueeck, um fazendeiro de 45 anos e proprietário de uma serraria, usou Gein como trabalhador braçal por 10 anos.
“Você não podia conversar com ele sobre nada, ele logo mudava a conversa para falar de algum crime ou sobre o caso Hartley ou o caso Hogan. Ele sempre tinha alguma teoria maluca sobre como o crime havia sido cometido e de como a polícia estava investigado.”
Outro tópico favorito de Gein para conversas, diz Ueeck, era mulher. Ele falava sobre:
“…quão bonita a Senhora Hill era, ou sobre como Bernice Worden era educada e gorda. Uma vez estávamos conversando sobre Mary Hogan e eu disse, ‘Se você tivesse passado mais tempo cortejando Mary ela estaria cozinhando para você ao invés de estar desaparecida.’ Ed revirou os olhos e mexeu o nariz como um cachorro farejando um gambá e disse, ‘Ela não está desaparecida. Ela está lá em casa agora.’ Mas Eddie sempre estava falando coisas doidas assim.”
Na abertura da temporada de veados este ano, Ueeck acertou um jovem animal nos bosques da propriedade de Gein. Enquanto ele se afastava, Gein veio na estrada em seu Ford marrom.
“Ele geralmente dirigia tão devagar que você podia correr e ser mais rápido. Mas por alguma razão ele estava dirigindo muito rápido, mas ele estendeu a mão pela janela e acenou. Era 11h, a hora em que Eddie estava levando o corpo de Bernice Worden para a fazenda.”
Três horas depois, Ueeck foi fazer uma visita a Gein. Ele sabia que Gein odiava que qualquer um caçasse em sua fazenda e Ueeck pensou que tranquilizaria as coisas se fosse pessoalmente falar sobre o animal em que ele atirou. Gein estava no quintal trocando os pneus de seu carro.
“Ele devia ter acabado de massacrar Bernice, mas ele não parecia preocupado. Ele estava tirando seus pneus para neve e colocando pneus normais. Se qualquer um tirasse seus pneus para neve nessa época do ano você diria que ele estava louco ou tentando encobrir suas trilhas. Mas não Eddie Gein. Ele sempre estava fazendo coisas assim.”
Nem todos os vizinhos de Ed Gein viam seu comportamento estranho como mera excentricidade. Clifford e Effie Banks, dois outros vizinhos, viveram com um considerável medo de Gein, embora nunca tenham mencionado isso.
Voltando em 1942, quando Cliff Banks estava construindo seu celeiro e precisava de ajuda, Ed Gein apareceu para dar uma mão. “Aconteceu que tínhamos uma parente nos visitando aquele dia e ela usava short”, diz Cliff, “e Eddie ficou encarando suas pernas.” Antes de partir, ele perguntou de forma bastante informal onde vivia a mulher. Naquela noite, um homem entrou na casa da parente de Banks e, estrangulando o filho dela, exigiu saber onde ela estava. Então fugiu.
Quando a mãe de Ed Gein morreu, a filha de Banks começou a ouvir barulhos do lado de fora da casa à noite, mas seus pais pensaram que ela estava imaginando coisas. Uma noite, Gein bateu na porta e perguntou à Senhora Banks se ele podia entrar.
“Ele disse que queria construir uma coisa e gostaria de dar uma olhada na nossa. Ninguém mais estava aqui e por algum motivo eu decidi não deixá-lo entrar. Eu acho que posso agradecer à minha sorte por isso.”

Na igreja metodista episcopal cheia de flores de Plainfield, os vizinhos prestam sua última homenagem Bernice Worden, a última vítima de Ed Gein. Foto: Life – 2/12/1957.
OS MISTÉRIOS SOBRE UM ASSASSINO IMPASSIVO SE APROFUNDAM
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Mesmo quando Plainfield se despediu da última vítima de Ed Gein, o mistério que tapou sua sinistra carreira só cresceu. Autoridades locais, impressionados como qualquer um pelas revelações, irritaram as pessoas da cidade ao serem relutantes em divulgar detalhes. O promotor Earl Kileen, após obter a confissão de Gein da morte de Worden, queria colocar Gein em um hospital mental e fechar o caso. Mas a pergunta irresistível ainda não foi respondida: Ed Gein matou apenas duas mulheres, como ele disse, ou matou todos os 11? Delegados de condados vizinhos e detetives de Chicago invadiram Plainfield para ver se as vítimas de Gein incluíam pessoas desaparecidas de suas regiões.
Gein fez uma lista de nove túmulos que disse ter roubado. As cabeças foram embalsamadas, o que parecia apoiar suas declarações. Ainda em sua fazenda, foram encontrados livros sobre embalsamento, uma seringa e formaldeído. Em sua maneira demente, Gein era um trabalhador meticuloso. Especialistas duvidaram que um homem, trabalhando ao luar, pudesse abrir um túmulo. Cavar covas é meio dia de trabalho para dois homens, além disso, a maioria dos caixões estão em abóbadas.
Em primeiro lugar, as autoridades não estavam interessadas em pegar a lista de Gein e verificar os túmulos. Mas eles cederam à pressão e esta semana planejam dar uma checada nos cemitérios. Se os túmulos estiveram intocáveis, Gein, que agora está em um hospital para uma observação de um mês, se levantará nos Estados Unidos como um horrível assassino em massa. Mesmo que as sepulturas tenham sido perturbadas, isso não resolveria o mistério completamente – houve outras vítimas que ele matou e, se sim, quantas? Parece um mistério que até mesmo o profundo homem perturbado, com sua tranquilidade e expressão vaga, não pode ter certeza.
NOTA DO APRENDIZ: Plainfield, Wisconsin, é um local tão remoto que parece uma daquelas cidades de filmes de terror esquecidas do mundo. Na verdade, nem mesmo é uma cidade, é um vilarejo cuja população em 1957 consistia de 670 pessoas. Ainda hoje, nada mudou, apenas algumas crianças que nasceram nos últimos 60 anos aumentando a população para 897 pessoas. O assassino em série Ed Gein continua a ser o morador mais famoso do local. Segundo Harold Schechter em Deviant: True Story of Ed Gein, the “Original” Psycho (Desviante: A Verdadeira História de Ed Gein, o Psicopata “Original”, 1998 – em alusão ao filme “Psicose“), Gein contou aos investigadores que entre 1947 e 1952 fez pelo menos 40 visitas noturnas a cemitérios para exumar corpos recém-enterrados. Uma reportagem do Stevens Point Daily Journal de 25 de Novembro de 1957, intitulada “Empty Coffins Discovered in Graves at Plainfield; Appears To Back Up Gein’s Story” revelou que autoridades exumaram duas covas e não encontraram nada dentro (uma das covas tinha um pé de cabra), o que aparentemente corroborava a versão de Gein. Robert H. Gollmar, em Edward Gein, America’s Most Bizarre Murderer (Edward Gein, O Mais Bizarro Assassino dos Estados Unidos, 1981) revela que Allan Wilimovsky do laboratório criminal do Wisconsin participou da abertura de três túmulos indicados por Gein. Os caixões estavam dentro de caixas de madeira. O topo das caixas estava a cerca de um metro da superfície do solo. Gein roubara as sepulturas logo após os funerais, enquanto ainda não estavam completamente fechadas. Como Gein descreveu, eles encontraram um caixão vazio, outro ele falhou em abrir quando esqueceu onde havia deixado a pá, o terceiro ele roubou o cadáver, mas devolveu algumas partes do corpo, assim como os anéis.
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- Ed Gein, o dia em que o serial killer chamou Freud de louco
- Psicose, por trás do Bates Motel
Universo DarkSide – os melhores livros sobre serial killers e psicopatas
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