Os alemães sempre tiveram, digamos, uma linguagem cinematográfica única. As coisas nunca parecem ser como deveriam em uma filme alemão. Muitos possuem um enredo obtuso e são carregados de simbolismos bizarros. Nekromantik, de Jorg Buttgereit, é um deles.
O filme é um dos clássicos absolutos do cinema gore. Lançado em 1987, foi banido de vários países e tornou-se um cult movie ao longo dos anos muito devido ao seu impacto originado por sua arte transgressiva que incluía, principalmente, necrofilia. Mas o filme é muito mais do que a simples transa de um ser vivo com um ser morto. Nekromantik fala sobre relacionamentos co-dependentes, sobre o enfrentamento das inadequações do sexo masculino, além é claro, de muita bizarrice.
Ao longo dos anos, conheci três tipos de pessoas que assistem a esse filme. Você provavelmente se enquadra em um dos três tipos abaixo:
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Aquela pessoa que não se aprofunda ao tema proposto e assiste ao filme pelo simples prazer de ver tripas caindo ou o sangue jorrado de uma cabeça recém-decepada;
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Aquela pessoa que por mais que o filme seja nojento e terrível, consegue absorver tudo como um “bom cinéfilo” e ao final filosofa com os amigos sobre as metáforas da obra de arte;
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Aquela pessoa que, após vomitar várias vezes, consegue assistir até a metade do filme. De tão enojada e ofendida, ela pega o DVD e manda alguém queimá-lo e ainda te xinga por ter recomendado o filme;
Minha opinião é a seguinte: dê uma chance a Nekromantik.
O filme
Rob Schmadtke (Daktari Lorenz) trabalha para à Agência Joe Streetcleaning (sugestivo o nome, não?), em uma equipe cujo trabalho é remover corpos dilacerados de acidentes de carros em ruas e estradas. Sua amante, Betty (Beatrice Manowski), aparentemente fica em casa durante todo o dia, vivendo dos baixos rendimentos do namorado. Os dois vivem uma vida sem mordomias e tranquila. Entretanto, eles possuem um estranho e bizarro gosto: Algumas partes dos corpos que Rob coleta nas ruas, vão parar como enfeites em potes de vidros no apartamento do casal. E um belo dia, para agradar a namorada, Rob decide apimentar a vida sexual de ambos. Ele leva para casa um novo amigo: um cadáver apodrecido que ele retirara de um pântano naquele dia.
Os dois necrófilos fazem um belo e doce amor com o cadáver naquela noite. Bom, amor doce foi por minha conta mesmo, a cena é horripilante. Vejam, não me critiquem por falar mal do gosto sexual do casal. Existem certas perversões sexuais que são contra a lei, necrofilia é uma delas. Além do mais, creio que a maioria de vocês não atingiriam um orgasmo chupando um olho humano ou sendo penetrado(a) por um cadáver em putrefação.
Bem, o casal decide manter o amigo morto na casa e enquanto Rob dá duro no serviço, Betty passa o dia lendo contos para o amante e claro, transando muito com ele. Mas o conto de fadas dura pouco. Rob é demitido do seu emprego por repetidos atrasos e quando chega em casa, é duramente criticado por sua namorada.
“E agora, como conseguiremos outro cadáver? Quanto tempo acha que este vai durar? Olha o estado!”
Betty parece ter ficado grilada com o namorado e ao mesmo tempo gostado mais da transa com o cadáver do que com o próprio amante vivo. Ela larga Rob e leva consigo o corpo em decomposição. Em uma carta no melhor estilo “Dear John”, ela explica que o estava deixando pois ele era um perdedor e não gostaria de passar o resto da sua vida ao lado de um. Abatido, Rob passa a fazer sexo com as partes de corpos que mantem em casa. Chega a espatifar o seu gatinho de estimação (humm muitos assassinos, serial killers começam matando animais, não?). Quando pedaços de corpos e órgãos de animais mortos não o satisfazem mais, ele passa pra uma próxima etapa: A busca por uma mulher de verdade para… sexo.
Ele pega uma prostituta e a leva para um cemitério local, romântico, não? Quando a prostituta ri dele por ele não conseguir ereção, Rob a estrangula até a morte, conseguindo assim a sua ereção. Ele então faz sexo com o cadáver. Após o ato de necrofilia, Rob cai no sono e é descoberto na manhã seguinte por um velho coveiro. Rob o mata com a pá que o velho usava para cavar covas, em uma das mais feias cenas do filme. (Bom, aqui somos poupados de saber se Rob violou ou não o cadáver do Sr.).
Voltando ao apartamento, somos apresentados a, talvez, a mais sinistra, bizarra e nojenta cena do filme. Solitário, depressivo e de mal com a vida, Rob realiza um ritual suicida, o hara-kiri, enquanto se masturba. Arghhhh! Pra quem não sabe, o Hara-Kiri (“cortar a barriga” em japonês) é um ritual suicida no qual o suicida corta sua própria barriga e remove seus órgãos internos, consequentemente ele morre por esventramento. Foi um ritual bastante comum no Japão medieval, cometido por guerreiros, como uma forma de pedir desculpas pelos seus erros, escapar da desonra, pedir perdão ou provar sua sinceridade.
Voltando a cena, provavelmente, nem todo espectador conseguirá assistir ao ritual de Rob. Enquanto ele suicida, somos apresentados ao seu pênis (claramente um pênis de borracha) que jorra sangue e sêmen por todos os lados.
Bom, não pretendo fingir que Nekromantik não é nada mais do que um dos mais ofensivos e pútridos filmes já feitos. Muitos o comparam com outro clássico do gênero: Cannibal Holocaust. No entanto, é tão artístico em seu propósito que é fácil perdoá-lo por suas falhas, sejam elas morais ou cinematográficas. O filme é deprimente e o diretor Buttgereit não faz rodeios. Os efeitos são fracos mas o cadáver principal é bastante realístico, o bastante para fazer o estômago de alguns embrulhar. Para mim, um dos grandes pontos positivos do filme são as performances, especialmente do ator Daktari Lorenz. Seu Rob é muito bem caracterizado e, na verdade, um personagem que vemos direto no nosso mundo real. Um pervertido sexual, um psicopata, uma daquelas almas que buscam por companhia, mas da forma errada. (Vide Jeffrey Dahmer).
O grande ponto negativo para mim é uma cena snuff. A morte real de um coelho que sangra até a morte após ter seu pescoço furado. Ver os espasmos do animal não é pra qualquer um. Posteriormente ele é esfolado e tem suas vísceras retiradas. O assassinato do coelho não aconteceu durante as filmagens, foi um snuff video que o diretor Jorg Buttgereit conseguiu e decidiu colocar, entretanto, acho esse tipo de coisa totalmente desnecessária e anti-artística.
Nekromantik é um daqueles filmes que todos detonam no lançamento mas que, anos depois, se desenvolve em um irracional culto de seguidores. Hoje em dia, em comparação com filmes mais modernos do gênero, o filme não parece assustar, na verdade, para alguns, pode até parecer cômico, mas ainda assim, é bastante significativo. O filme é uma grande metáfora do amor perdido e de como a solidão pode levar um homem à beira da sanidade.
Apesar de não ser um grande filme, Nekromantik faz jus à sua reputação de um clássico inovador dos filmes de terror modernos. É um filme que ajudou a inaugurar a era dos filmes de horror extremo e, por isso, devemos gratidão. Goste ou odeie, Nekromantik tem sua estrela na calçada da fama do cinema gore.
Um aviso para os mais sensíveis, o filme não é nada agradável de se assistir. O filme tem pouco mais de uma hora, mas acreditem, ninguém poderia assistir mais tempo do que isso.
Apenas como curiosidade: estão enganados os que acham que esse tipo de história só acontece em filmes. Muitos de vocês já devem ter lido histórias de serial killers da vida real publicadas aqui no blog e que se assemelham ao comportamento de Rob. Recentemente, publicamos em nossa fan page no facebook o caso de uma sueca de 37 anos que foi presa em setembro de 2012 suspeita de fazer sexo com esqueletos. Em sua casa foram encontrados 6 crânios, 1 espinha dorsal e mais de 100 ossos, além de dois CD’s intitulados: “Minha Necrofilia” e “Minha Primeira Experiência”. Segundo relatos locais, ela escreveu em um fórum na internet:
“Minha moral define meus limites e eu estou preparada para aceitar a punição. É uma pena. Eu quero o meu homem como ele é, vivo ou morto. Ele me permite encontrar a felicidade sexual.”
Ela também tinha um código de acesso ao necrotério local, e alegou que comprou os ossos (que eram de diferentes partes do mundo) através da Internet, alegando ser para fins históricos. “Encontramos algumas fotos em que ela aparece lambendo um crânio”, disse o promotor do caso.
A mulher foi acusada de “violação da paz dos mortos” e poderá pegar até dois anos de cadeia.
No próximo post mais uma dica sobre um fantástico filme de horror gore. E a propósito, a cena final de Nekromantik é instigante.
Informações
Título: Nekromantik
Direção: Jorg Buttgereit
Produção: Manfred O. Jelinski
Escrito por: Jörg Buttgereit e Franz Rodenkirchen
Elenco: Daktari Lorenz, Beatrice Manowski e Harald Lundt
Edição: Jörg Buttgereit e Manfred O. Jelinski
Lançamento: 1987
País: Alemanha
Língua: Alemão
Obs.: O filme teve uma sequência em 1991. “Nekromantik 2” foi proibido na Alemanha e o diretor Jorg Buttgereit chegou a ser interrogado pela polícia alemã sob à alegação de “glorificação da violência”.
Veja abaixo o filme legendado
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