Em meados de 1984, um prisioneiro da Casa de Custódia de Taubaté que pleiteava o regime de prisão domiciliar foi analisado por peritos do estado. Os especialistas concluíram que os ataques de violência do homem estavam ligados ao fato dele não suportar a prisão. Eles recomendaram a sua soltura. Um trecho do relatório dizia:
“Entendemos que [ele] vem se prejudicando dentro do ambiente carcerário, por seus transtornos mentais; por outro lado, dado seu tipo aventureiro de personalidade, a situação carcerária torna-se uma situação muito difícil, que o leva a apresentar transtornos mentais. Assim, é possível que fora da prisão apresente-se bem melhor adequado, já que pode descarregar as suas ansiedades deambulando, ou em qualquer atividade, o que manteria o seu equilíbrio mental. Parece-nos antes um perturbado que um criminoso. Assim, cremos que a sua periculosidade seja muito pequena. Pode receber os benefícios da prisão domiciliar que pleiteia.”
Solto no mundo, este homem se tornaria um assassino em série impiedoso e sádico. Seu nome era Fortunato Neto e ele recebeu o apelido de “Maníaco do Trianon”. Neto ceifou a vida de mais de uma dezena de homens homossexuais entre 1986 e 1989.
Trabalhando no caso do assassino em série, o psiquiatra forense Guido Palomba escreveu sobre o relatório de 1984:
“Os dois senhores que assinaram tal relatório estavam, em parte, com razão, pois fora da prisão o examinado efetivamente ‘descarregou as suas ansiedades em qualquer atividade’, no caso, praticando inúmeros homicídios e atos antissociais. É lamentável um parecer desses, não tem graça técnica nem científica, é apenas a opinião de dois indivíduos sem o trambelho do bom senso e da razão.”
Para Palomba, inexistia em Neto “altruísmo, piedade, compaixão. Não tem o menor remorso… O réu é portador de epilepsia de forma condutopática”. Um indivíduo incurável, finalizou Palomba.
Outro psiquiatra, José Roberto Paiva, teve um diagnóstico diferente. Para o médico, Neto não tinha nenhum tipo de epilepsia, ele era apenas um puro e maligno psicopata. “Sua loucura é a moral.”
Palomba e Paiva sepultaram o “amoral e frio de sentimento” Neto. Ele nunca mais sairia da prisão.
Referência: Arruda, Roldão. Dias de Ira. Globo Livros. 2001.
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