Reportagem Retrô é uma coluna do blog O Aprendiz Verde que traz reportagens, matérias e artigos antigos publicados em algum lugar do nosso tempo-espaço. Trazer essas matérias é uma forma de resgatarmos o passado e, por um instante, ter um vislumbre daquele registro de época.
A reportagem retrô de hoje foi publicada na revista Cruzeiro, em 27 de outubro de 1970, e noticia os crimes do serial killer brasileiro José Paz Bezerra.
JOSÉ PAZ, O ESTRANGULADOR | Reportagem de Luiz Antônio Luiz e Claudine Petroli
“Ele é um rapaz carinhoso, com olhos que parecem sorrir e um rosto que transmite felicidade. Seus carinhos me envolviam num calor profundo que me fazia esquecer as tristezas e angústias da vida.”
É assim que a doméstica Aparecida da Silva Oliveira, 37 anos, separada do marido e mãe de dois filhos, define o monstro estrangulador. Policiais de São Paulo, da Guanabara e Estado do Rio estão caçando José Paz Bezerra, de 24 anos, forte, alto e atraente. Numa casa do Morro Ponto-Chic, em Nova Iguaçu, d. Maria Paz do Nascimento implora: “prendam meu filho“.
JOSÉ ESTRANGULOU CINCO MULHERES EM SÃO PAULO
A polícia paulista recebeu a denúncia de que 20 mil cruzeiros em joias tinham sido furtados em uma residência na Rua Jesuíno Cardoso. Eera dia 7 de outubro. Mais um serviço para os investigadores e detetives da 15ª Delegacia Policial de São Paulo. Tudo foi examinado. Depois interrogados os suspeitos. À exceção do copeiro José Paz Bezerra, os demais empregados da casa estavam presentes. Um a um foram ouvidos. Mas quando começaram a fazer perguntas à doméstica Aparecida da Silva Oliveira, durante nove horas consecutivas, ela afirmou:
– Um dia José saiu à noite para comprar leite. Quando voltou, estava inquieto. Trazia um jornal com o retrato-falado do estrangulador. Estranhei o comportamento dele. Eu o conhecia há quatro anos e nunca o tinha visto assim. Depois me pediu dinheiro e quando afirmei que não tinha ele gritou: “Olha, já matei muitas mulheres e você pode ser a próxima”. No curto espaço de tempo, foi carinhoso, chorão, ameaçador e, com modos, implorava.
A mulher não deu ouvidos às ameaças do amante, a quem tinha ensinado a profissão de copeiro, para que pudessem trabalhar juntos num mesmo local. Ele então se dirigiu para o quarto e, abrindo uma maleta, mostrou casacos, jóias, japonas e blusas de mulheres que dizia ter estrangulado. Ela começou a ligar os fatos e lembrou-se dos últimos passos de José. Quase todas as noites ele saia, dizendo que ia para o trabalho numa churrascaria no bairro de Diadema. Ela lembrou-se ainda das ameaças qu eele tinha feito a sua filha de 15 anos, caso ela (Aparecida) não conseguisse dinheiro para ele. Lembrou-se também de que José é que apanhava o filho do patrão, de cinco anos, na escola. Imediatamente ela conseguiu o dinheiro solicitado pelo amante com seus patrões.
O HOMEM IDEAL
Quando Aparecida conheceu José, viu no rapaz a pessoa ideal. Passados alguns meses de namoro, resolveram viver juntos. Ela se separara do marido e morava com seus dois filhos – uma menina e um menino. Depois de ensinar-lhe a trabalhar como copeiro, conseguiram emprego numa casa de família. Durante certo tempo estiveram ausentes da capital paulista, morando em Ituiutaba, Minas Gerais.
Mas em novembro de 1969 voltaram para São Paulo. Montaram casa na Vila Mangalot, onde duas moças seriam assassinadas mais tarde, sem que a polícia localizasse o autor do crime, que agora é atribuído a José Paz Bezerra.
Conseguiram logo emprego. O amante de Aparecida parecia levar uma vida pacata. Carinhoso e simpático, ele conseguia dela o que desejava, mas quando falhavam os seus argumentos românticos, apelava para a violência. Recebia sempre o perdão da mulher. De julho deste ano em diante, passou a proceder de maneira diferente e deixava inquieta a sua amante. À noite saía, e quando voltava encontrava a mulher dormindo. No dia 7 último, ele furtou 20 mil cruzeiros em jóias e na residência da Rua Jesuíno Cardoso e fugiu. Deixou o emprego e a amante.
Para o delegado do 15º Distrito Policial de São Paulo, sr. Sílvio Pereira, José da Paz Bezerra nunca foi motorista de táxi. As vítimas, segundo o policial, eram atraídas pelos encantos do assassino, que as levava para os locais desertos e depois as matava. Entre as mulheres que estrangulou estão Ana Rosa dos Santos, Wanda Pereira da Silva, Nilza Cardoso, Cleonice dos Santos Guimarães e Wilma Negri.
No Rio, a mãe de José Paz Bezerra, dona Maria Paz do Nascimento, teme pela volta do filho ao lar. Ele ameaçou matar o padrasto na última visita que fez ao Morro Ponto-Chic, há seis meses atrás. A polícia carioca também quer ver José na cadeia. Na Guanabara ele esteve detido diversas vezes por assalto, vadiagem, porte de arma ilegal e para averiguações. Sempre usa nomes falsos e os policiais já conhecem nove dos que geralmente emprega.
No Estado do Rio, os detetives e investigadores acreditam que José Paz Bezerro seja o mesmo homem que estrangulou quatro mulheres na Baixada Fluminense, entre elas Joenina Carielo, sobrinha de um ex-delegado de Homicídios, em Niterói.
Todos os efetivos policiais da Guanabara, São Paulo e Estado do Rio estão na caça a José Paz. As autoridades não desprezam a hipótese de que o monstro estrangulador seja o mesmo sujeito que assassinou uma mulher no Jardim Marambaia, Itaboraí, e outra em Itaipuaçu, Maricá (RJ). O matador de mulheres, segundo o detetive Ivan Garcia, de São Paulo, “está com seus dias contados“.
Nota do Aprendiz
Depois de entregar as joias roubadas para um caminhoneiro, José Paz Bezerra saiu de carona pela estrada São Paulo – Brasília – Belém. Na capital paraense, passou a assediar qualquer mulher que encontrasse na via pública, sempre usando lábia e promessas mirabolantes, aliadas a uma simpatia que usava para atrair suas vítimas.
Em Belém, o monstro estrangulador matou Maria Teresa Marvão, 44, na véspera do Natal. Tempos depois, ela assassinou outra mulher, esta nunca identificada, cujo corpo foi encontrado nas proximidades onde o cadáver de Maria Teresa foi encontrado. Em 27 de setembro de 1971, o maníaco estrangulou Anibalina Ataíde Martins, e manteve relações sexuais com o cadáver.
José Paz Bezerra foi preso dois meses depois pelo delegado Armando Mourão, com a preciosa ajuda da ex-cunhada de Anibalina, que um belo dia viu o serial killer passando pela rua, o seguiu e relatou seu paradeiro à polícia.
Ele era uma pessoa que se podia considerar um sujeito de boa aparência, bem-apessoado, e isso chamava atenção das mulheres […] Ele disse que fazia aquilo por amor, porque ele achava que elas não deveriam pertencer a mais ninguém. Psicopata, né?
[Armando Mourão]
Julgado por vários assassinatos de mulheres, teve como advogado de defesa o famoso Márcio Thomaz Bastos, que futuramente viraria Ministro da Justiça e advogado de Thor Batista e Carlinhos Cachoeira. Psiquiatras disseram que José Paz era um indivíduo raro na sociedade, “frio, calculista e bárbaro. Liquidando suas presas à semelhança animalesca.” Foi diagnosticado com “personalidade psicopática do tipo sexual (Necrófilo, Sado-Masoquista-Fetichista)“.
Após cumprir a pena máxima no Brasil, 30 anos de reclusão em regime fechado, José Paz Bezerra foi solto em 24 de novembro de 2001.
“Pelas minhas contas foram 24 mulheres.”
[José Paz Bezerra, serial killer]
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Fontes consultadas: [1] Serial Killers – Made in Brazil. Ilana Casoy, DarkSide Books (2016); [2] Estrangulador do Morumbi é libertado após passar 30 anos na cadeia – Folha de São Paulo;
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